O guitarrista, vocalista e compositor Gabriel Thomaz é um dos maiores expoentes da cena independente do rock nacional. Iniciou sua trajetória profissionalmente em 1988, com a cultuada banda de psychobilly Little Quail and the Mad Birds, fundou o longevo e premiado conjunto de rock Autoramas, além de manter outros projetos como Lafayette & os Tremendões e Gabriel Thomaz Trio.
Ao longo do bate-papo ele compartilhou suas visões e experiências como artista independente, falou sobre alguns de seus projetos musicais e outros assuntos.
Por Álvaro Silva (rotasongs@gmail.com)
Você está na estrada desde 1988, quando fundou o Little Quail and the Mad Birds. Como é viver de música no Brasil? As coisas melhoraram desde quando você começou?
Gabriel Thomaz: Melhoraram muito. Hoje em dia é tudo mais fácil. Vivi épocas em que tudo era muito difícil. Os equipamentos eram terríveis, só os artistas com muito jabá “existiam no mercado”, os estúdios eram muito ruins e as pessoas que trabalhavam nos estúdios não sabiam gravar rock. As viagens eram muito penosas, viajávamos em ônibus sem ar condicionado, calor de dia e frio congelante à noite. Hoje a gente viaja de avião, os equipamentos são bons, os estúdios são bons e os profissionais que trabalham nos estúdios sabem operar os equipamentos. Enfim, hoje em dia é tudo muito melhor.
Quais são as vantagens e desvantagens de ser um artista/banda independente?
Gabriel Thomaz: Atualmente quase todo mundo é independente. Sobre as vantagens, posso dizer que quando você é independente a liberdade artística é total, é o sonho de todo artista.Você manda em sua própria carreira, isto é, você não é um mero fantoche, você é sócio de si mesmo. Antigamente você era “sócio de uma empresa” que mandava você trabalhar do jeito que eles queriam, e se você desobedecesse, eles acabavam com a “sociedade” e você era esquecido. Ser independente é muito bom, a própria palavra é esclarecedora, né? Agora, se destacar é sempre difícil, sendo independente ou não.
Em 2019 você lançou o disco “Babababa” com o Gabriel Tomaz Trio, que é um projeto instrumental. Você encontrou alguma resistência em termos de receptividade ou o projeto rolou legal?
Gabriel Thomaz: Foi um disco que não teve tanta repercussão quanto os do Autoramas, já que música instrumental tem um público muito menor. Mas é um disco que gostei pra caramba de fazer, pois sempre tive vontade fazer algo nesse sentido. Fizemos muitos shows e espero que na volta da pandemia a gente continue fazendo. Esse projeto me deu muito prestígio e muita satisfação.
O Autoramas lançou no ano passado o “B-Sides & Extras Vol.1” e mais recentemente o “B-Sides & Extras Vol.2”. Você ainda tem muito material antigo da banda engavetado? Podemos esperar por um Vol. 3?
Gabriel Thomaz: Estou fazendo uma busca nos arquivos do Autoramas. No começo, achei que iria encontrar só umas dez faixas para fazer o Vol.1, mas acabei achando vinte. A gente já fez tanta coisa nesses mais de vinte anos de banda que às vezes eu até me esqueço. Vou continuar procurando, se eu achar mais canções podemos fazer um Vol.3. Por que não?
Hoje em dia, com as plataformas digitais, a gente pode reorganizar tudo e lançar essas coisas sem custo de fabricação de disco. Ficou uma coisa fácil. Além disso, nós estamos trabalhando em um álbum novo.
Você poderia nos dar mais alguma informação sobre o novo álbum dos Autoramas?
Gabriel Thomaz: Estamos aguardando a possibilidade de nos encontrarmos para poder ensaiar. Rolou o seguinte: no ano passado nós gravamos quatro músicas e aí começou a pandemia. Então tivemos que parar. Acabou que essas quatro músicas saíram num EP que lançamos na Europa – um compacto em vinil daqueles pequenininhos. Mas eu tô com um monte de músicas prontas. Basta a banda poder se encontrar para mandar brasa.
Um estilo que marcou muito seu desenvolvimento musical foi a Jovem Guarda, né? Inclusive você tem um projeto muito bacana com o tecladista Lafayette. Fala-se muito do Roberto Carlos, um pouco do Erasmo e quase nada dos outros artistas. Qual foi a importância desse movimento para o desenvolvimento do rock nacional?
Gabriel Thomaz: A Jovem Guarda não foi um movimento, foi um programa de televisão. O estilo da música é o iê-iê-iê e o Roberto Carlos realmente foi o maior de todos, mas também teve o Erasmo, a Wanderléa, o Renato & Seus Blue Caps, Eduardo Araújo e muitos outros artistas. Acontece que as pessoas geralmente esquecem os artistas de qualquer gênero, as coisas vão ficando no passado e isso é natural. Eu gosto muito da Jovem Guarda, me identifico muito, gosto do rock brasileiro dos anos 60, entender as letras, entender as gírias… Se ninguém gostar, pra mim não faz diferença nenhuma. Eu gosto e tô na minha.
Como você enxerga o atual cenário da música brasileira dominado pelo sertanejo universitário, pagode, funk e pop descartável? Você acha que o rock algum dia vai conseguir retomar o protagonismo que teve nos anos 80?
Gabriel Thomaz: Eu acho que o rock nunca teve protagonismo, a não ser na época do Roberto Carlos, ali na Jovem Guarda, muito antes de eu nascer. Nos anos 80 o rock não teve protagonismo, o que acontece é o seguinte: quem mais vendeu nos anos 80 foi a Xuxa, foram as Paquitas, o Julio Iglesias, o Roberto Carlos… Não foi o rock. Pô! A Xuxa vendia dez vezes mais do que as bandas mais famosas de rock, isso é uma impressão de quem gosta de rock.
Eu gosto de rock. Eu toco, eu ouço, eu curto. Seja moda ou não. As pessoas ficam resmungando que ele não está na mídia e coisa e tal. Você vai se deixar levar por isso? Hoje tá tudo a um clique de distância, por que eu vou reclamar? Antigamente eu gostava de coisas que ninguém ouvia e era dificílimo, quase impossível de achar os discos. Hoje é facílimo, é moleza. Por que eu vou ficar reclamando? Deixa esses outros estilos pra lá. Isso é tudo uma jabazeira, uma coisa comprada, sabe?
Você é um cara que sempre esteve envolvido em vários projetos musicais. Alguma coisa planejada para 2021 que você poderia nos contar?
Gabriel Thomaz: Eu sempre estou fazendo muito coisa. Em 2020 os Autoramas lançou onze singles e dois álbuns. Em 2021 já lançou um. Tenho muitas ideias, o difícil às vezes é realiza-las, pois tem custos, precisa de tempo, concentração, parcerias e coisa e tal. Daí eu faço as coisas de acordo com o que é possível. Se eu pudesse fazer todas as ideias que eu tenho na minha cabeça, acho que as pessoas não iriam nem me aguentar de tanta coisa que eu iria lançar.
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